08/10/2016

O circo, por Orlando Orfei


Fui o único do mundo a trabalhar com hienas. Tive que aturar aquela hiena que se vê no cinema. Eu na jaula com um chicote. Fui o único no mundo, agora já passou. Era rápido, agora estou velho, tenho 88 anos.... Tive um derrame cerebral anos atrás, que me paralisou totalmente, mas consegui sair do buraco e trabalhar de novo com as feras. A primeira vez que entrei na jaula, um ano depois do derrame, eu disse para o público: "Desculpem-me se os movimentos não estão perfeitos, um derrame me paralisou. Foram meses na cama e na cadeira de rodas." É quando a vida de um homem parece não interessar mais. Mas comigo não foi assim. Foram horas e horas de ginástica, o que demonstra que a derrota de um homem está só na entrega. Se não se entrega, não está derrotado”. 

Orlando começou a trabalhar no circo aos 9 anos de idade e só foi estrear aos 14. Ele mesmo explica: “ Passei cinco anos ensaiando, todo dia, todo dia, todo dia. O número mais difícil que existe é o malabarismo. O bom malabarismo, não é? No circo você será um bom artista se começar antes dos 20 anos. Mas um grande artista, não. O grande artista tem que ser como a ginasta romena Nadia Comaneci, que começou quando tinha 4 anos e conseguiu, nas Olimpíadas, fazer uma coisa nova. É assim no circo também. Se você não inicia cedo, não faz nada. 

Para não fugir à regra e devido às crises que hoje estão atingindo todos os circos no Brasil. O Circo Orlando Orfei é o maior e, dos maiores, é o único que ainda está se aguentando, Orlando desabafa dizendo que os adolescentes de hoje já não ligam mais para o circo, pois, segundo ele, os maiores de 10 anos e os menores de 40 não amam mais tanto o circo. “Pensam que o circo é uma diversão para as crianças. Mas não é só isso. O circo é diversão para crianças e também para quem já foi criança. Eles não entendem que o circo está baseado na habilidade e na beleza de nossos filhos, que estudaram 10, 15 anos para fazer um número que, na frente do nosso respeitável público, durará cinco minutos. Dez anos de sacrifício por cinco minutos de trabalho. Isso é o circo. 

O circo é assistido por  pessoas sensíveis e inteligentes, que compreendem nossos sacrifícios. Passam os anos e o adolescente, quando vira adulto, volta ao circo para trazer as crianças. E sairá mais entusiasmado que as crianças e voltará sempre, até que, um certo dia, virá junto com seus netos àquele circo onde, no passado, transcorreram momentos de alegria.  

Quando o público aplaude, quando ri, isso dinheiro nenhum no mundo pode pagar. Só os artistas provam essa experiência de dar alguma coisa, alguma alegria ao público. Charles Chaplin disse que os momentos mais felizes de sua vida eram aqueles em que via surgir um sorriso nos lábios de uma criança. Eu, Orlando Orfei, agradeço aos meus pais por terem me feito nascer em um circo, porque vi milhões de crianças sorridentes e pais felizes pela alegria despertada nos filhos. O papa João XXIII disse que o circo é um apostolado de paz. Eu me sinto orgulhoso de ter dedicado a minha vida a essa diversão pura”.

Reprodução / Gente da Nossa Terra

Matéria baseada em dados e notícias da Enciclopédia Abril-1967, Jornais Tribuna de 
Santos, Correio Popular e Jornal da Barra e revista Problemas Brasileiros,  
além de entrevistas com artistas do circo Paolo Orfei no Brasil.
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